Hoje, 26 de maio de 2019, completam-se dois anos e meio do nosso retorno ao Brasil. 30 meses daquele pisar em terras firmes, literalmente, daquela sensação de liberdade que nos tomou, daquela euforia de se livrar de um ano de perseguições e perrengues. Os primeiros dias aqui foram de pura paz, de reconhecimento de terreno, de contemplação e gratidão. Gratidão por termos conseguido enfrentar 48 horas em trânsito, praticamente como foragidos, não daqueles que deixam seus países para fugir da fome, da miséria, das guerras, mas daqueles que voltam ao seu país para fugir de uma guerra particularmente cruel, a guerra da vingança cega e desenfreada, que nem a justiça portuguesa foi capaz de cessar, a guerra da desigualdade de gêneros, da criminalização da mulher, a guerra que sempre atinge o elo mais fraco.
A recuperação de uma guerra dessas é lenta e, apesar da euforia inicial da libertação, juntou-se a essa recuperação, a síndrome do regresso, uma readaptação que por si só, já é um grande desafio. Resignificar a vida depois de tantos sonhos deixados para trás, o sonho de viver no exterior, as diferenças gritantes de segurança, educação, cultura. Foram dois anos e meio morando na Europa e, mesmo com todas as dificuldades enfrentadas, alguns aspectos relacionados à qualidade de vida são infinitamente superiores aos do Brasil. Não foram poucas as vezes, nesses dois anos e meio de volta, que pensei seriamente em retornar para a Europa, em tentar recuperar oportunidades que deixei por lá. Mas as feridas abertas por aquela guerra faziam lembrar que nenhuma oportunidade valeria mais que a autonomia de estarmos em nosso país de origem. Dessa forma, fomos aproveitando as oportunidades que se abriam por aqui.
Seguimos a correnteza do rio da vida, que nos levou a diversos caminhos, descortinando paisagens deslumbrantes, apresentando figuras fascinantes e desmascarando situações desconcertantes. Toda uma trilha seguida até, finalmente, podermos começar a colher os frutos que plantamos constantemente, mesmo em meio às tormentas, aquele acreditar inabalável, a gratidão mesmo nos momentos de maior turbulência. Foi dessa gratidão que mais bênçãos foram chegando e hoje estou no ponto exato que sonhava, quando planejava o nosso retorno: estabilizada em uma cidade que, comparada a outras capitais que já vivi no Brasil, pode ser considerada uma das melhores, apesar de tudo. Fazendo um trabalho que eu amo. Uma família reestruturada e saudável, podendo contemplar as pequenas alegrias da vida. Saber que a justiça está sendo feita, ainda que a passos lentos. Estar ao lado de alguém que admiro e amo profundamente, alguém que nos ensina importantes lições, alguém com quem posso compartilhar minha vida sem me anular, alguém que foi fundamental para a nossa cura e com quem a troca é sempre gratificante.
O tempo agora se igualou, dois anos e meio lá e dois anos e meio cá, dois anos e meio de vários sonhos realizados e a certeza de que muitos outros ainda virão. A felicidade não depende mesmo do lugar onde estamos, porque ser feliz, no fim das contas, é só uma questão de decisão.
Foto por Lysie Marion |
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